Por Márcia Jamille | @MJamille | Instagram
Nos últimos dias comentei na página do Arqueologia Egípcia no Facebook que esta semana foi realizada uma denuncia sobre a possibilidade de terem posto cola epóxi (um tipo de super cola) na máscara mortuária de Tutankhamon, acusação que o Ministério de Antiguidades negou estar ciente, mas que segundo as fontes da denuncia eles já sabiam há meses.
De acordo com os denunciantes, restauradores que preferem permanecer anônimos, durante a manutenção do expositor da peça a barba da máscara mortuária soltou e foi colada de volta em seu lugar com um material inadequado, uma super cola. Ainda nas palavras deles a ordem de intervenção na peça partiu de superiores.
Caso esses eventos sejam reais o incidente é trágico por tais motivos:
☥ O uso de um material inadequado para o restauro, a cola epóxi, já que uma das regras mais básicas do restauro é que sejam utilizados materiais de fácil remoção e que não comprometa a integridade da peça. O que não é o caso da epóxi.
☥ As pessoas que manipularam o artefato para por a barba no lugar, de acordo com as denuncias tentaram suavizar a aparência da cola lixando a área e assim teriam arranhado o queixo da imagem.
☥ A ignorância em acreditar que a peça estava quebrada ao ponto de colar o objeto no lugar, visto que a barba é um item que já foi removido na década de 1920, como aponta os registros fotográficos. Porém, caso esse fato já fosse conhecido no momento da intervenção, então a ordem partiu da má fé.
☥ A ausência de sensibilidade daqueles que deram a ordem para colar a peça. Isso pode ser um reflexo de um dos grandes problemas do turismo arqueológico, que é quando o artefato deixa de ser um registro para a ciência e passa a ser um bem de consumo. Quantas vezes vocês já não ouviram ou leram semelhante frase “A tumba de Tutankhamon é tão pequena e sem graça que não valeu o dinheiro que paguei”?
Com a polêmica, no sábado, 24 de janeiro de 2015, ocorreu no Museu Egípcio do Cairo uma conferência para a imprensa onde foi apresentada a questão da intervenção com a super cola na máscara mortuária. O conservador alemão, Christian Eckmann, especialista em conservação de materiais arqueológicos feitos de vidro e metal, analisou na manhã daquele mesmo sábado a máscara para saber que tipo de aderente de fato foi utilizado e garantiu durante a reunião que mesmo sem saber especificamente qual o tipo da super cola o material utilizado neste caso está de acordo com as normas internacionais de restauro, ou seja, seu uso é reversível, porém ainda não é possível relatar se o objeto sofreu algum dano, a exemplo dos arranhões; no caso deles será realizada uma investigação para saber se são antigos ou se foram feitos no momento em que colocaram a cola.
Eckmann ainda esclareceu que a cola anterior, que foi colocada no objeto em 1941 (caso a visita do rei Farouk I tenha sido mesmo em 1949 então existe um equivoco nessa afirmação) para fixar barba, pode ter simplesmente se deteriorado e que por isso o item teria caído.
Durante o evento o Ministério das Antiguidades e os coordenadores do Museu Egípcio do Cairo pediram desculpas pelo o ocorrido e ao final os representantes de ambos pediram ponderação à imprensa ao relatar o acontecimento e que as pessoas parem com as especulações agressivas.
Entretanto, essa questão parece ir mais além. Jackie Rodriguez, uma turista que visitou o Museu Egípcio em 12 de agosto de 2014, forneceu para a agência de notícias AP uma fotografia de dois homens que estão a executar os trabalhos de reparo no artefato, enquanto a galeria estava aberta. “Todo o trabalho parecia palhaçada”, disse ela que complementou “Foi desconcertante porque o procedimento ocorreu em frente a uma grande multidão e, aparentemente, sem as ferramentas adequadas”.
A egiptóloga Monica Hanna, especialista em conservação de pinturas murais, também realizou denuncias: através do seu Twitter comentou que cinco conservadores tentaram delatar o ocorrido, mas após uma visita do ministro das antiguidades ao museu no dia 17 de novembro de 2014 eles foram demitidos.
Horas após a reunião entrei em contato com a Hanna para saber se os ativistas egípcios do Egypt’s Heritage Task ainda têm planos de denunciar o Museu Egípcio para o Ministério Público e ela respondeu que sim, eles irão seguir em frente com a denúncia.
Composta por incrustações de vidro e pedras semipreciosas, a máscara mortuária de Tutankhamon é um objeto feito em ouro maciço martelado e somente a barba pesa cerca de 2 quilos. Ela foi vista pela primeira vez por olhos modernos em 1926 — quatro anos após a descoberta da KV-62 —, protegendo a cabeça e os ombros do faraó Tutankhamon.
Fonte:
Máscara de Tutancâmon é danificada após restauração com material errado. Disponível em < http://oglobo.globo.com/sociedade/historia/mascara-de-tutancamon-danificada-apos-restauracao-com-material-errado-15118812?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=O+Globo >. Acesso em 22 de janeiro de 2015.
Botched repair of Tut mask ‘reversible’: German conservator. Disponível em < http://www.france24.com/en/20150124-botched-repair-tut-mask-reversible-german-conservator/?aef_campaign_date=2015-01-24&aef_campaign_ref=partage_aef&ns_campaign=reseaux_sociaux&ns_linkname=editorial&ns_mchannel=social&ns_source=twitter >. Acesso em 24 de janeiro de 2015.
Archaeologists Want Egyptian Officials Charged for Damage to Tutankhamen’s Burial Mask. Disponível em < http://www.nytimes.com/2015/01/24/world/middleeast/archaeologists-want-egyptian-officials-charged-for-damage-to-tutankhamens-burial-mask.html?smid=tw-NYTOpenSource&seid=auto&_r=0 >. Acesso em 24 de janeiro de 2015.