Uma egiptóloga egípcia, Monica Hanna, alega ter desvendado um complô que envolve os Estados Unidos e países europeus, visando boicotar a repatriação do famoso busto da rainha Nefertiti ao Egito. A descoberta expõe as complexidades por trás da posse desse ícone histórico e questiona o papel desempenhado por nações poderosas na preservação e restituição do patrimônio cultural.
Nefertiti, que governou o Egito há cerca de 3000 anos durante o Período Amarniano ao lado de seu esposo Akhenaton, teve sua estátua encontrada em 1912 pelo arqueólogo alemão Ludwig Borchardt (1863-1938), que a contrabandeou para a Alemanha. Atualmente, a peça está em exposição no Neues Museum, em Berlim, enquanto o Egito busca seu repatriamento.
Documentos recentemente descobertos pela egiptóloga revelam que os Estados Unidos teriam bloqueado a repatriação, temendo abrir precedentes que levassem à devolução de outros artefatos que estavam em museus europeus e norte-americanos. Hanna encontrou esses documentos no Arquivo Nacional dos Estados Unidos em 2021, durante sua pesquisa sobre os “homens dos monumentos”. O “homens dos monumentos” se refere a um grupo encarregado de proteger tesouros culturais durante e após a Segunda Guerra Mundial. Eles faziam parte principalmente de nações aliadas e sua missão era localizar, identificar e recuperar obras de arte e artefatos culturais que haviam sido saqueados ou estavam em perigo nas mãos dos nazistas.
O cenário revelado por Hanna desafia a narrativa heroica, indicando que os Estados Unidos bloquearam ativamente o retorno do busto de Nefertiti. Segundo Hanna, isso exemplifica o “imperialismo cultural inerente ao Ocidente” e sua visão da herança do Egito.
A estátua gerou pedidos de repatriamento desde sua exposição na Alemanha. Documentos sugerem que, na década de 1930, autoridades alemãs haviam aprovado a repatriação, mas Hitler negou, alegando estar “apaixonado por Nefertiti”. Hanna considera isso uma pilhagem nazista, já que Hitler vetou a repatriação.
Porém, após a morte de Hitler, e quando a estátua foi encontrada pelos Aliados em uma mina de sal em Wiesbaden, o primeiro-ministro do Egito, Mahmoud El Nokrashy Pasha, pediu a devolução da obra. No entanto, os Estados Unidos sugeriram que o Egito buscasse apoio do Reino Unido, França e União Soviética. A União Soviética concordou com a devolução, enquanto as outras recusaram, alegando que o busto chegou à Alemanha antes da guerra.
Mas, as descobertas de Hanna apontam que nos bastidores a história era outra. Algumas pessoas se opuseram ao repatriamento, entre elas Lamont Moore (1909-1988), um oficial da unidade da seção de Monumentos, Belas Artes e Arquivos. Ele afirmava que o pedido dos egípcios era algo meramente nacionalista e para satisfazer a sua vaidade.
Mas as descobertas de Hanna não param por aí. Ela alega ter encontrado no Arquivo Nacional do Reino Unido documentos comprometedores. Eles revelam um verdadeiro complô, no qual o curador-chefe da coleção egípcia do Museu Britânico estava se correspondendo com o embaixador britânico em Berlim para garantir que as negociações entre o governo egípcio e o governo prussiano fracassassem. Sobre esses países terem se recusado e até conspirado para evitar a devolução de Nefertiti, Hanna salienta que “isso tem a ver com o colonialismo, já que o Ocidente se considera herdeiro do Egito Antigo”.
Essas últimas revelações sobre Nefertiti lançam luz sobre um capítulo controverso da história, onde o imperialismo cultural e neocolonialismo parecem ter influenciado as decisões que moldaram o destino deste artefato egípcio. As evidências apresentadas por Monica Hanna ressaltam a necessidade urgente de reconsiderar a posse de Nefertiti e devolvê-la ao seu legítimo lar no Egito. Esta descoberta também destaca a importância de reexaminar a ética por trás da gestão de artefatos culturais de significância global.
Fontes:
Unearthed papers show US thwarted return of Nefertiti bust to Egypt. Disponível em < https://www.thenationalnews.com/mena/egypt/2024/01/18/us-thwarted-return-of-nefertiti-bust-to-egypt-after-second-world-war/ >. Acesso em 19 de janeiro de 2024.
Queen Nefertiti bust ‘should be treated as Nazi loot and returned to Egypt’. Disponível em <
https://www.thenationalnews.com/world/europe/2024/01/11/queen-nefertiti-bust-should-be-treated-as-nazi-loot-and-returned-to-egypt/ >. Acesso em 19 de janeiro de 2024.