O Museu Nacional do Sudão, situado em Cartum, atualmente está em uma área controlada pelas Forças de Apoio Rápido (RSF), grupo paramilitar envolvido em uma sangrenta guerra civil contra o exército regular sudanês. O conflito em curso tem tornado extremamente difícil obter informações precisas sobre o estado do museu, mas relatos alarmantes surgem de tempos em tempos, apontando para um cenário de saques e contrabando.
Em 2022, imagens de satélite revelaram caminhões transportando artefatos em direção às fronteiras do Sudão, levantando preocupações sobre o destino de itens inestimáveis do acervo. Um funcionário do museu, que pediu anonimato, não atribuiu diretamente a responsabilidade pelo desaparecimento dos objetos, mas confirmou que eles estão, de fato, desaparecidos. Recentemente, a emissora nacional do Sudão informou que o museu foi alvo de uma “operação de saque e contrabando em larga escala”.
Em junho de 2023, um vídeo que circulou nas redes sociais supostamente mostra combatentes da RSF invadindo o laboratório de bioarqueologia do museu, abrindo contêineres que guardavam múmias e restos mortais. A RSF, no entanto, negou qualquer envolvimento no roubo de artefatos. Além do Museu Nacional, outros espaços culturais, como a Casa Khalifa em Omdurman e o Museu de Nyala, no estado de Darfur do Sul, também possuem relatos de saques, o que agrava o impacto do conflito sobre o patrimônio histórico do Sudão.
Um Símbolo da Cultura Sudanesa em Risco
A situação atual é preocupante por várias razões. O Museu Nacional do Sudão abriga uma vasta coleção de peças que datam desde o período neolítico até o islâmico. O museu, fundado em 1971, é um dos mais importantes da África, localizado entre os rios Nilo Branco e Nilo Azul, e oferece uma visão ampla da rica história da região.
Sua coleção de mais de 100.000 peças abrange diversos períodos históricos, incluindo artefatos do Reino de Kerma (2500 a.C. – 1500 a.C.), da civilização Kushita (744 a.C. – 300 a.C.) e do período Meroítico (300 a.C. – 350 d.C.). O museu também preserva importantes relíquias da ocupação egípcia na Núbia, com itens que remontam ao Reino Antigo, Médio e Novo do Egito (2660 a.C. – 900 a.C.).
Entre os destaques estão as impressionantes estátuas dos reis kushitas e suas divindades, além de afrescos cristãos da Catedral de Faras, que datam do período medieval, quando o cristianismo se firmou na região.
O Museu Nacional do Sudão representa não apenas a história de uma nação, mas o legado de toda a África e do Oriente Próximo. Com a instabilidade crescente, o saque desses artefatos representa uma perda incalculável para a humanidade. Para além dos artefatos físicos, o museu simboliza o papel central do Reino de Kush na história mundial, especialmente em um momento em que o Egito, a Grécia e Roma estavam em destaque.
O conflito no Sudão tem causado uma crise humanitária sem precedentes, com milhões de refugiados fugindo para países vizinhos, além das incalculáveis perdas de vidas humanas. À medida que a violência continua, o futuro do patrimônio cultural do país se torna cada vez mais incerto e o Museu Nacional permanece como um dos símbolos mais vulneráveis dessa devastação.
O que está em jogo não é apenas a preservação de artefatos antigos, mas a memória de civilizações que moldaram a história do mundo e que agora correm o risco de serem perdidas para sempre.
Fontes:
Looting of the Sudan National Museum – more is at stake than priceless ancient treasures
https://theconversation.com/looting-of-the-sudan-national-museum-more-is-at-stake-than-priceless-ancient-treasures-238528?fbclid=IwY2xjawFOKn1leHRuA2FlbQIxMAABHUoZAsMn_kgYPKNQ89pwWb8S44XKwIojF7Vxc6WvjZF0pQI2Zo3yW8uuLA_aem_egwfQxDj6IcnKNbr0chsBA
Tens of thousands of artefacts looted from Sudan museum, says official
https://www.theguardian.com/world/article/2024/sep/09/sudan-national-museum-khartoum-artefacts-looted
UNESCO warns of looting from Sudan museums and damage to heritage amid war
https://thearabweekly.com/unesco-warns-looting-sudan-museums-and-damage-heritage-amid-war