No Egito Antigo, existiam alguns artefatos que eram feitos com um material que não só fascinou os antigos habitantes das margens do Nilo, mas também atravessou eras para encantar a contemporaneidade: a faiança egípcia. Nomeada pelos egípcios como “tjehenet”, que traduz-se como “aquilo que é brilhante”, esse material carrega consigo uma história rica e uma técnica singular que transcende o tempo.
Surpreendentemente, o termo “faiança” tem raízes europeias. Originado de “fayence”, referente a um tipo de cerâmica vitrificada já conhecida na Europa no final da Idade Média, o termo é uma homenagem à cidade de Faenza, ao norte da Itália. A associação entre essa cerâmica europeia e a milenar egípcia foi estabelecida pelos primeiros exploradores europeus no Egito (é importante deixar claro que a conexão foi estabelecida por conta da semelhança, mas, elas não têm ligação histórica).
No Egito Antigo, as cores mais prevalentes na faiança eram o azul e o verde, imitando pedras semipreciosas como feldspato, turquesa e especialmente o valorizado lápis-lazúli. A tentativa de replicar essas pedras levou os antigos egípcios a desenvolverem uma técnica especial, criando uma cerâmica semelhante ao vidro, porém com um processo de vitrificação peculiar. Enquanto o vidro é moldado em altas temperaturas, a faiança era “trabalhada a frio”, para só depois ser moldada e queimada.
Os artesãos preparavam uma pasta a partir de uma mistura de sílica, cal e álcali. A sílica era extraída de pedras de quartzo trituradas, enquanto a cal provinha das pedras calcárias usadas na construção dos monumentos egípcios. O álcali, crucial para o processo, era obtido a partir de cinzas de plantas queimadas ou do natrão, um sal natural usado na mumificação. Essa composição formava a base da faiança, à qual se poderia adicionar compostos metálicos, como o cobre, para obter a deslumbrante cor azul. Mas, a faiança egípcia não se limitava apenas ao azul e verde; os egípcios também criavam peças em branco, vermelho e outras cores, oferecendo uma gama diversificada de tonalidades e possibilidades artísticas.
Os vestígios arqueológicos revelam que os antigos egípcios dominavam a arte da faiança desde períodos pré-dinásticos, bem antes do florescimento do Egito sob os faraós. Com o avançar do tempo, a faiança ganhou destaque, tornando-se um elemento essencial na vida cotidiana e na ornamentação de monumentos.
O faraó Djoser, notório por erguer a primeira pirâmide do Egito, foi um entusiasta da faiança. Parte de seu complexo funerário foi adornado com pequenos azulejos de cor verde azulado, revelando o uso hábil e artístico dessa cerâmica milenar. Assim, a faiança egípcia permanece não apenas como um legado artístico, mas como um testemunho da técnica e criatividade dos antigos egípcios, que transformaram sua habilidade de transformar pastas de faiança em uma arte deslumbrante e que atravessou os milênios.
Fontes:
Nicholson, Paul T., 2009, Faience Technology. In Willeke Wendrich (ed.), UCLA Encyclopedia of Egyptology, Los Angeles. http://digital2.library.ucla.edu/viewItem.do?ark=21198/zz0017jtts
The Brilliant Manufacture of Egyptian Faience. Disponível em < https://more.bham.ac.uk/birminghamegyptology/eton-myers-project/virtual-museum/objects-come-to-life/articles/tjehenet-egyptian-faience/ >. Acesso em 20 de novembro de 2023.